ESTADÃO | José Maria Tomazela
Desde sexta-feira (15 de novembro de 2017), graças à ajuda de um grupo de voluntários, a aposentada Claudete Fernandes da Silva Nogueira, de 59 anos, e seu cão Rex, vivem uma nova vida, no bairro São Camilo, zona norte de Sorocaba, interior de São Paulo. Depois de ser despejada pelos enteados e ficar sem ter onde morar, ela recebeu a casa construída por até então desconhecidos que se condoeram de sua situação. “Não tenho palavras para agradecer, por isso oro todos os dias, peço a Deus que a generosidade dessas pessoas se espalhe pelo mundo, pois assim vamos ter um mundo melhor”, disse dona Claudete.
O drama da aposentada começou em meados de 2016, com a morte do marido, com quem vivia há vinte anos. Ele havia passado a casa onde moravam para os filhos de outro casamento e detinha apenas o direito de uso. Com a morte dele, o chamado usufruto cessou e, em meados de 2016, os filhos de outro casamento entraram com ação pedindo o imóvel. Sem ter onde morar, a aposentada contratou um advogado que acompanhou o processo até a sentença, que foi favorável aos filhos.
Já na fase de aplicação da sentença, Claudete procurou a Defensoria Pública de Sorocaba que nomeou a advogada Hélen Garbim para acompanhar o processo. “Desde o início sabíamos que o despejo dela era uma questão de tempo, pois o direito dos filhos era inquestionável”, disse Hélen. O advogado Tales Pereira Cardoso Filho, sócio dela num escritório de advocacia, costuma atuar com a sócia mesmo nos processos encaminhados pela Defensoria Pública.
É ele quem conta como tudo começou. “Quando o oficial de Justiça bateu na porta da dona Claudete para pedir a desocupação da casa, ela chegou a pensar na pior saída, mas ligou para nós, seus advogados, e fomos lá. Ver o desespero dela, acompanhada do seu cachorro, nos comoveu e decidimos iniciar a campanha.”
Antes de casar com o esposo falecido, Claudete morava numa casa precária, no Jardim São Camilo. O imóvel ficou quase 20 anos sem reforma e foi alvo de ladrões e vândalos. Hélen diz que o imóvel estava inabitável. “A casa se encontrava coberta pelo mato, sem telhado, com a laje condenada, sem portas e janelas, totalmente inapropriada para moradia. Então pensamos: vamos aproveitar o que for possível e fazer uma casa nova.” No dia 24 de maio, enquanto a aposentada e seu cão ficavam abrigados na casa de uma amiga, os advogados passaram a usar as redes sociais para conseguir ajuda e despertaram uma onda de solidariedade.
O arquiteto Felipe Fernan vistoriou o imóvel e fez o projeto de reforma. A laje e algumas paredes tiveram de ser refeitas. Um pedreiro se apresentou para realizar o trabalho a preço de custo. Um vizinho cedeu água, energia e espaço em sua casa para a guarda dos materiais. Um empresário doou as telhas e mão de obra para o telhado. Outro doou as partes elétrica e hidráulica, outro as caçambas. Voluntários se organizaram em mutirões aos sábados para a limpeza do terreno, retirada de terra e entulhos e chapisco das paredes. “Quando a campanha completava um mês, ela foi esfriando. Desesperados com a ideia de não conseguirmos concluir, começamos a vender rifas com ajuda amigos”, conta Hélen.
De doação em doação, a casa foi tomando forma: muros, pisos, azulejos, decoração e móveis. Muitos vezes os próprios advogados foram retirar o material doado. E também puseram a “mão na massa” nos trabalhos da obra. Hélen lembra que a casa foi pintada no feriado de 7 de setembro, com a ajuda de amigos. “Passamos dias trabalhando até depois do expediente para dar conta da obra e do escritório, mas valeu a pena. Só conseguimos concluir esse projeto por conhecer tanta gente do bem. Sem essa corrente de solidariedade, a senhora Claudete não estaria feliz hoje.”
Dona Claudete conta que, ao acordar, de manhã, se belisca para ter certeza de não estar sonhando. Saudada pelo Rex, ela abre a janela e deixa o sol entrar, antes de percorrer os cômodos para conferir a nova moradia, com móveis reluzentes. “Estou no céu agora”, diz a aposentada, que recebe pouco mais de R$ 600 por mês e usa parte do dinheiro para se tratar de diabetes e pressão alta. Ela diz que os advogados, agora, são a sua família. “A doação beneficia mais quem doa do que quem recebe, mas me reservo o direito de ir visitá-la sempre que for possível”, disse Hélen.